As vozes e os ecos

Fundação Portuguesa das Comunicações, 2018

 

“Il y a un trou dans le réel” Dora Garcia

 

“As vozes e os ecos”, individual de Sofia Pidwell na Fundação Portuguesa das Comunicações, joga com os conceitos de ordem e desordem, de apri- sionamento e emancipação em uma performance que deixa rastros.

O espaço expositivo é transformado em um ambiente cenográfico com telas e tramas metálicas e ativado por uma ação pontual, que acontece no momento de abertura da mostra e que ecoa no restante do período da exposição. A coreografia proposta pela artista é extremamente simples, mas ao repeti-la até a exaustão Sofia deseja revelar fragilidades do sistema no qual vivemos.


Cinco corpos realizam um movimento circular repetitivo. Nada físico os prende ou condiciona seu caminhar, ainda assim eles parecem fadados a seguir nessa dinâmica ad infinitum. Não há música ou falas, apenas silêncio. Mas como em um filme de cinema mudo, as conversas, os ruídos e até os pensamentos podem ser imaginados e sentidos. O som parece vir de fora, na forma de um comando de ordem, e ao mesmo tempo de dentro, como um pedido de socorro ou um grito de liberdade. De maneira metafórica, Sofia parece querer denunciar e se rebelar contra as forças totalitárias não visíveis que criam amarras, se infiltram e condicionam o nosso ser e estar no mundo.


Como em “1984”, romance distópico de George Orwell, um grande olho que tudo controla também se faz presente, orquestrando o que parece ser um ballet mecânico. Todos se vestem e agem da mesma maneira, como homens números, homens máquinas. A poesia surge no momento em que um deles rompe com a lógica do sistema e encontra uma possibilidade de emancipação. Nesse momento, a dinâmica antes determinada por um grid geométrico se converte em um ritual de evocação, transformação, exorcização e cura.


A partir da entropia, Sofia levanta questões, faz denúncias, desconstrói máximas, questiona paradigmas e, principalmente, abre caminhos. Com ges- tos e imagens, sem dar explicações ou criar grandes discursos, ela nos faz olhar para realidades e situações, para muitos, invisíveis. Nos faz pensar que talvez só a força coletiva seja capaz de quebrar o status quo.


Isabella Lenzi